‘O Duende’ na Arte, na Dança


O Duende

O duende está em todas as artes mas, para o poeta Federico García Lorca, encontra maior espaço na música, na dança e na poesia falada. E adverte que não há mapa nem exercício para encontrá-lo. Duende é antes expor-se, “é existir como quem se arrisca”. É o destemor, a coragem de dizer. Tem duende o que se envolve de mistério e de sons negros na opinião de Manuel Torres, cantaor flamenco.

Nas raízes da Espanha, a morte é um espetáculo. As touradas são o símbolo nacional carregado de duende, de mistério, é a luta destemida do entregar-se à morte. Aqui está uma das facetas do espírito oculto deste país ibérico. Dolorido, mas revelador da intimidade do povo.

No baile flamenco o mesmo acontece: é necessário dar-se por inteiro e submergir na essência deste, contando uma história: de amor, morte, vida, sofrimento ou alegria. O bailaor não interpreta, senão faz dos lamentos do cante – e de toda a arte flamenca – extensão do seu próprio corpo. Duende é ferida aberta que transforma quem pôde presenciá-lo; não se repete, o duende é único. Ou como disse outro poeta, Goethe: “Poder misterioso que todos sentem e nenhum filósofo explica”.

Por se tratar de tema abstrato, lembro de um fato narrado no “Teoria e Prática do Duende”, de Lorca: a andaluza Pastora Pavón, Niña de los Peines, cantava em uma taberna de Cádiz com a platéia apática. Quando terminou, fez-se o silêncio, apenas cortado pela voz baixa e sarcástica de um homem: “Viva Paris”. Esta fala naquele ambiente tinha a conotação de que não importavam técnica e maestria. Niña bebeu um trago, matou toda a estrutura da canção e cantou com duende. Conta-se que os ouvintes foram tomados pela voz da cantaora e tiveram ganas de rasgar a roupa de tão intensa que foi a música.

Quando alguém diz “Este tem muito duende”, de certa forma conclui que o artista tem frescor, entusiasmo e profundidade. Mas isto não basta, hay que poner los pelos de punta.

Fonte: http://flamencobrasil.com.br/