Dança e educação somática: uma experiência com o método GYROKINESIS®.


Dança e educação somática: uma experiência com o método GYROKINESIS®.

ROSÁRIO, Rosana Lobo.

Belém: Escola de Teatro e Dança da Universidade Federal do Pará – ETDUFPA. Instituto de Ciências das Artes, Programa de Pós Graduação em Artes – PPGARTES; Orientadora Ana Flávia Mendes.

Fonte: http://www.portalabrace.org/viicongresso/completos/pesquisadanca/Rosana_Lobo_ROSARIO_Dan__a_e_educa____o_som__tica_uma_experi__ncia_com_o_m__todo_GYROKINESIS.pdf

RESUMO Este artigo tem como objetivo analisar os desdobramentos da prática de educação somática, em especial o método GYROKINESIS® aplicados na disciplina Leitura e Percepção Corporal – LPC do curso Técnico em Dança da Escola de Teatro e Dança da UFPA no período de agosto a setembro de 2011. Criado por Juliu Hovarth, o método utiliza os movimentos naturais da coluna, flexão e extensão, flexão lateral, rotação e movimento de ondas. O estudo foi dividido em três partes: a primeira consiste na breve descrição das atividades desenvolvidas pela disciplina; a segunda apresenta a análise do relato de alguns alunos que participaram das aulas; a terceira, o resultado experimental artístico da disciplina. O estudo concluiu que o método apresenta grande potencial para a formação do intérprete-criador em dança sobre três aspectos: prevenção e cura de lesões, melhora técnica e o desenvolvimento das capacidades expressivas.

PALAVRAS-CHAVE: GYROKINESIS®: dança: educação somática. KEYWORDS: GYROKINESIS®; dance; somatic education.

Dança e educação somática: uma experiência com o método GYROKINESIS®

O presente estudo relata a minha experiência como professora e ministrante da disciplina Leitura e Percepção Corporal – LPC do 4º bimestre do curso Técnico em Dança da Escola de Teatro e Dança da Universidade Federal do Pará – ETDUFPA. Tal disciplina possui em sua ementa: “a leitura e a percepção do corpo como objeto de vivência e suas transformações através de técnicas corporais.” (UFPA, 2003, p. 21).

Para desenvolver essa disciplina optei em proporcionar aos alunos a vivência de algumas técnicas corporais e alguns métodos da Educação Somática: Yoga, Feldenkrais, Pilates e GYROKINESIS® .

Tal escolha deve-se pelo fato dessas técnicas possuírem a tomada de consciência do corpo como ponto de partida e de chegada das técnicas estudadas. A primeira unidade desenvolvida foi o estudo da anatomia dinâmica, sendo este assunto fornece a base para o desenvolvimento da consciência corporal, a qual só é possível por meio de sensações. O estudo de anatomia na sala de aula na disciplina LPC foi uma condição sine que non por permitir associações aos movimentos que foram sendo realizados, dessa forma o aluno é capaz de pensar o próprio corpo e como também o movimento que esta sendo realizado. A proposta desse estudo anatômico não era para que os alunos ficassem debruçados nos atlas de anatomia ou estudo de peças separadas do corpo humano, mas sim, através do toque do e no colega, possibilitando aos alunos o sentir, o perceber e o ver das estruturas anatômicas num corpo vivo. Para esta disciplina foi priorizado o estudo do sistema ósseo, muscular e articular, pois segundo Dascal, (1999) o estudo das estruturas ósseas permite ao indivíduo uma segurança interior e uma resistência, ambas muito importantes frente à instabilidade de nossa época. Estudar anatomia em um curso de dança não tem como finalidade de aprender a realizar diagnóstico, mas de levar este aluno a pensar em seu corpo e as formas de se movimentar, liberando tensões desnecessárias e realizar movimentos com o menor gasto energético. Paralelo aos estudos anatômicos iniciei a unidade denominada Técnicas e Práticas Corporais, e entre os assuntos tratados encontram-se os conceitos e princípios de Educação Somática, considerada como o campo emergente interdisciplinar que surgiu no século XX, protagonizado por profissionais das áreas da saúde, da arte e da educação. Thomas Hanna, filósofo e escritor, desenvolveu um método de mudança do corpo a partir de uma reeducação de movimentos, no sentido do interno para o externo. Ele define pela primeira vez, em 1983, a expressão Educação Somática, em um artigo denominado What is Somatics? publicado na revista Somatics. Hanna (2003) reinventa a palavra soma e a distingue dos conceitos de corpo: […] soma é o corpo subjetivo, ou seja, o corpo percebido do ponto de vista do indivíduo. Quando um ser humano é observado de fora, por exemplo, do ponto de vista de uma 3ª pessoa, nesse caso, é o corpo que é percebido. […] (HANNA, 2003) Hanna apud Strazzacappa (2009) define a Educação Somática como “a arte e a ciência de um processo relacional interno entre a consciência, o biológico e o meio ambiente. Estes três fatores vistos como um todo agindo em sinergia” (HANNA apud STRAZZACAPPA, 2009, p. 48).

Sob a denominação de Educação Somática, foram criados diversos métodos educacionais de conscientização corporal, tal como: Técnica Alexander (Matthias Alexander), Bartenieff (Ingmar Bartenieff), Feldenkrais (Moshe Feldenkrais), Ideokinesis (Mabel Todd), A história de criação dos métodos [somáticos] está estreitamente ligada à história pessoal de seu criador. Partindo de um espírito empírico-experimental, vários deles chegaram à formulação de técnicas em uma tentativa de contornar limites profissionais; outros, para solucionar questões pessoais: a perda de voz de Mathias Alexander; o problema de joelho de Moshe Feldenkrais; a doença renal de Mabel Todd; a insuficiência cardíaca de Gerda Alexander; os traumas pós guerra de Conrad; as debilidades físicas de Pilates; o traumatismo do calcâneo de Horvath, etc. (BOLSANELLO, 2011, p. 3)

A partir da criação desses métodos, uma série de novas práticas foram sendo criadas, porém singular devido as diferenças culturais e vivências corporais de seus criadores. Entre as diversas técnicas, sistemas e métodos alternativos existentes para o trabalho corporal, terapêutico e artístico, destaca-se o método GYROKINESIS® , o qual foi vivenciado e analisado na disciplina LPC. O método GYROKINESIS® , criado e desenvolvido por Juliu Hovarth, é inspirado nos princípios-chaves do Yoga, tai-chi-chuan, natação, ginástica artística e ballet. Motivado pelo desejo da auto-cura, o romeno, radicado nos Estados Unidos, Juliu Hovarth passou a investigar o movimento no seu próprio corpo criando sua teoria baseada em suas próprias experiências. No processo, ele observou atentamente os elementos da natureza, e desenvolveu um vocabulário de exercícios e princípios próprios, criando assim uma série de movimentos praticados no solo, conhecido originalmente de “Yoga para Bailarinos”, e hoje é denominado de GYROKINESIS® , o qual constitui a base de todos os exercícios de movimentos de GYROTONIC® .

O primeiro nível de GYROKINESIS®, denominado como THE ESSENTIALS OF BODY KINETICSTM – A essência do corpo dinâmico – é a base de toda a metodologia. A palavra chave é fluidez, onde as posturas não são mantidas por longos períodos de tempo, elas se conectam umas com as outras de forma harmoniosa através da respiração. Gelb (2000) alerta que nunca devemos tentar mudar ou melhorar diretamente a respiração, pois, assim como a circulação e a digestão, a respiração é uma função natural, e a única maneira de melhorá-la é criar condições adequadas em todo o organismo alterando os padrões de tensão desnecessários dentro do corpo que interferem nela.

Nos exercicios GYROKINESIS® experimentados na disicplina LPC, foram utilizadas diferentes formas de respirar, várias delas semelhantes aos pranayama1 realizados nas sessões de ioga. Entre os padrões respiratórios utilizadas no método GYROKINESIS® representativos, incluem, entre outros, a Respiração de Expulsar (Expelling Breath), uma respiração lenta, que emite um som de “whoosh” semelhante com o suspiro do oceano; ou a Respiração Tosse (Coughing Breath), uma respiração intensa semelhante a um movimento lento de uma tosse, que ativa os músculos abdominais profundos. 1 Pranayama é uma prática de respiração controlada, na qual aumenta a vitalidade e a concentração mental, além de expandir o nível de consciência. A respiração atua como uma ponte para o sistema nervoso e por meio das práticas de pranayama, é possível observar o nível de profundidade de sua conexão com a mente. Assim como a respiração se altera de acordo com os estados de espírito, também os estados psicológicos podem ser alterados pelo controle da respiração. […] (BROWN, 2009, p.314) Geralmente, as turmas dos cursos técnicos apresentam perfil bastante variados, no que se refere a experiência artística (dança, teatro, música), estilos de dança (jazz, ballet, contemporâneo, dança de salão, hip hop entre outros), inclusive variedade de idade (15 a 46 anos). O desafio da disciplina encontrado por mim foi de proporcionar uma experiência de conscientização corporal que fosse significativa para a formação e experiência de cada aluno e que principalmente, fosse possível agregar conhecimento para sua área específica de dança.

Os conteúdos sobre o corpo humano foram trabalhados através do método GYROKINESIS® de modo que os alunos manifestassem seus conhecimentos e concepções sobre a estrutura corporal com o objetivo de transmitir conhecimentos biomecânicos e anatômicos utilizando recursos propostos onde a teoria vai sendo experimentada mediante a realização de exercícios, do toque, da exploração de movimentos nos segmentos corporais e na observação das sensações, desenvolvendo assim o aspecto cinestésico dos participantes. Embora há diversos motivos para explicar o interesse de ministrar a disciplina LPC sob a ótica da educação somática e a utilização do método GYROKINESIS® , percebo aqui, em consonância com Sylvie Fortin (1999) que há três aspectos que atingem tanto intérpretes e coreógrafos, quanto professores para a utilização de métodos somáticos nas salas de ensaios: (1) a melhora da técnica, (2) a prevenção e cura de traumas e (3) o desenvolvimento das capacidades expressivas. Quando a gente começa a trabalhar com o GYROKINESIS® a gente vai percebendo que cada parte do corpo tem uma importância, então vamos reeducando o nosso corpo para realizar os movimentos que a gente já conhece. […] (Depoimento cedido de uma aluna do curso técnico em dança, 2011) Consegui viver cenicamente o que queria representar a partir do conhecimento corporal que o GYROKINESIS® oferece. (Depoimento cedido de uma aluna do curso técnico em dança, 2011) Eu me senti muito bem depois das aulas, o aprendizado é gradativo, a respiração é algo muito forte pra mim, porque eu não respirava corretamente para fazer os exercícios […] o GYROKINESIS® nas aulas de ballet me ajudou bastante, no pensar em alongar […] (Depoimento cedido de um aluno do curso técnico em dança, 2011)

Nos relatos a cima, é possível perceber que a partir do conhecimento anatômico e da realização do movimento coordenado com a respiração é possível a (re)educação corporal, a partir do refinamento da propriocepção, esta entendida aqui como a sensibilidade própria aos músculos, ossos, tendões e articulações. Concluo este estudo observando que as técnicas corporais, como o GYROKINESIS® vivenciado e estudado neste artigo e dentro das salas de aulas de dança, estão muito além que um treinamento complementar, porém cada vez mais estas técnicas e métodos estão integrados a própria técnica de dança desenvolvida. As práticas somáticas, bem como as técnicas corporais são encontradas nos diversos meios de formação em dança, os quais perpassam desde os conservatórios e escolas de dança às universidades que oferecem curso de dança (FORTIN, 1999), além do surgimento de cursos superiores em dança com abordagens somáticas, como a Faculdade Angel Vianna – no Rio de Janeiro; e Anhembi-Morumbi, em São Paulo. (STRAZZACAPPA, 2009). Acredito que as técnicas corporais, bem como a educação somática irão influenciar não somente as artes cênicas, mas principalmente toda área da educação.

BIBLIOGRAFIA BOLSANELLO, Débora. Afinal, o que é educação somática? In: ______ Em pleno corpo: educação somática, movimento e saúde. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2010, p.18- 31. _____________. Mexer sem tirar do lugar: a educação somática e o profissional de dança. Artigo publicado em http://www.movimentoes.com. Rio de Janeiro, 2011. BROWN, Christina. A bíblia do yoga: o livro definitivo em posturas de yoga. São Paulo: Pensamento, 2009. DASCAL, Miriam. Eutonia: o saber do corpo. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2008. FORTIN, Sylvie. Educação Somática: Novo ingrediente da formação prática em dança. Cadernos do GIPE – CIT. nº2. Salvador: UFBA, 1999. HANNA, Thomas. What is somatics? Somatics, New York, n.2, vol.14, nº2, p. 50, 2003. Universidade Federal do Pará, UFPA. Plano de curso: técnico em intérprete/criador – dança. 2003. STRAZZACAPPA, Márcia. Educação Somática: seus princípios e possíveis desdobramentos. In Repertório: teatro & dança – Ano 12, n.13 (2009.2) – Salvador: UFBA/PPGAC, 2009.2. GYROTONIC® , GYROKINESIS® and The Art of Exercising and Beyond® are registered trademarks of Gyrotonic Sales Corp and are used with their permission. THE ESSENTIALS OF BODY KINETICSTM is a trademark of Gyrotonic Sa